Cartografando espaços, percepções, histórias e memórias
A cartografia sonora envolve o mapeamento de sons de um determinado espaço utilizando registros sonoros como elementos principais para representar características de um lugar. “Se a cidade sempre está em movimento, como podemos entendê-la apenas por elementos visuais estáticos? A partir dos sons captados nas ruas se deseja entender como os lugares na cidade se comportam, assim formando a sua cartografia sonora” (Pease et al. 2019, p. 301). Nessa abordagem, o ouvir investigativo promove percepções, certas ideias e como visões de mundo são privilegiadas ou marginalizadas a partir do envolvimento dos sujeitos com momentos, sentimentos, situações cotidianas ou remetem a histórias e memórias vivenciadas.
Diferente da cartografia tradicional, que utiliza símbolos e coordenadas de forma matematizada para representar aspectos físicos, a cartografia sonora se concentra na dimensão acústica.
A cartografia sonora busca acompanhar um processo, e criar meios de acessar um patrimônio imaterial urbano [e outros] que a todo tempo se perde e se transforma pela intervenção humana. Que sons surgiram? Que sons desapareceram? Que informações podemos obter de um lugar através de seus sons? (Pease et al. 2019, p. 297).
Nesse horizonte, projetos de Cartografia sonora podem ser conectados a outras abordagens da Cartografia escolar, como por exemplo, a cartografia artística, cartografia afetivas, cartografia assistivas, cartografia colaborativas, cartografia sociais, cartografia tátil e outras. Nesse contexto, enquanto mediação rizomática da cartografia sonora, os processos formativos ocorrem no desenvolvimento (processualidade) e os resultados são novas gemas (conhecimentos) que brotam em diferentes direções, oportunizando novas perspectivas de estudos.
Em suma a cartografia sonora não se limita a um público específico, tampouco, busca homogeneizá-lo, são linhas de fugas que despertam o interesse, sensibilidade e criatividade dos envolvidos ressaltando a importância dos sons na construção de suas percepções espaciais e refletindo em múltiplas possibilidades de exploração e compreensão do mundo.
Algumas possibilidades de mediações…
As mediações rizomáticas ocorrem de forma orgânica, autônoma e espontânea, guiadas pelos interesses dos envolvidos. As ideias podem fluir mediante rodas de conversas e escutas ativas (quando o professor mantém um diálogo com os estudantes, prestando atenção e se interessando pelos assuntos desses interlocutores). Assim, conhecendo o contexto sociocultural e econômico dos estudantes, o professor, pode, a partir de discussões e audições cotidianas fomentar a ideia de mapeamento sonoro do bairro, da cidade ou qualquer outro espaço ou fenômeno que faça sentido para os envolvidos. Os mapas podem ser criados com ou sem tecnologia avançada, usando desde gravadores modernos e plataformas digitais até a escuta natural em aulas de campo, e representados em obras artísticas, emojis, mapas manuais e outros meios, como sugerido, abaixo:
Os mapas sonoros podem ser confeccionados em atividades escolares como oportunidade em explorar espaços urbanos (feira livre, guetos, áreas centrais, subúrbios…) e rurais (natureza), permitindo ouvir e registrar sons autênticos que capturam a essência dos lugares visitados. Isso revela como diferentes sons trazem informações sobre a identidade, memórias e as histórias dos lugares, além de destacar como a acústica varia conforme as estações, dias da semana, horários e o uso dos espaços
A cartografia sonora potencializa a análise e interpretação de obras de artes tornando-se intensidades em movimentos interativos e envolventes. As obras de artes (pinturas) seja abstratas ou realistas são passíveis de serem atribuídas trilhas sonoras que melhor se aproxime da ideia do autor ou interpretação de quem a contempla, como por exemplo, os estudantes poderiam interpretar ou imaginar os sons de vozes, do vento sobre as folhas, sorrisos, o barulho de animais ou humanos. Desse modo, projetos de mediação didática que envereda por esse campo potencializa a criatividade e fomenta a pesquisa pois não se trata de qualquer trilha sonora, há de contextualizar o cenário artisticamente representado tempo e espaço.
A arte (dança) são movimentos sincronizados ou mesmo aleatórios que dialoga com a música, com o ritmo e harmonia de forma profunda e reveladora, transmitindo mensagens corporais. A música guia os corpos, territórios vivos, expressivos e falantes em coreografias que expressam movimentos sincronizados ou aleatórios. Nesse movimento, os dançarinos conduzem os corpos por caminhos que evocam emoções, narrativas e significados, assim, as mediações didáticas podem incluir exercícios de dança livre, improvisação rítmica e criação de coreografias em grupo, onde cada participante contribui com sua própria “voz” corporal.
Em suma, a dança oportuniza experienciar como diferentes estilos musicais e ritmos evocam respostas distintas ao corpo, e como esses movimentos podem ser usados para contar histórias, representar sentimentos ou até mesmo questionar normas sociais e culturais. Dessa forma, o corpo se torna um mapa onde as rotas de exploração não têm limites, e a música é o fio condutor que guia essas descobertas.
Consiste em desenvolver mediações que exploram caminhos variados de representação gráfica, como os mapeamentos de músicas e poesias, pode ser uma forma rica e multifacetada de incentivo à experimentação de novas possibilidades de leitura e expressão do espaço.
A criação de cenários cartográficos para músicas e poesias, como prática de mediação didática rizomática, oferece uma forma única de explorar o espaço e a arte. Isso permite que os estudantes transitem livremente entre a interpretação do espaço e das obras artísticas, gerando experiências criativas e imersivas. Nessa lógica, cada música ou poesia serve como ponto de partida para que os estudantes criem mapas emocionais. Eles identificam e associam as emoções principais transmitidas pela obra (como paz, melancolia, alegria) e as representam visualmente em um mapa cartográfico abstrato ou realista. Esse mapa pode ser construído com núcleos, linhas, formas e texturas que traduzem a intensidade e os temas da obra.
Esses caminhos de mediação gráfica e sonora transformam o ato de mapear em uma atividade vivencial e artística, aproximando os envolvidos de uma compreensão rizomática do espaço, em que múltiplas vozes e expressões coexistem e revelam a complexidade dos lugares.
A mediação com a abordagem da cartografia sonora é um processo horizontal que se expande para diversas áreas de estudo e práticas educacionais, envolvendo composições de fonográficas em mapas que capturam os sons característicos de determinados espaços. Esses mapas permitem observar ambientes rurais ou urbanos e podem integrar estudos sobre biodiversidade acústica, auxiliando no monitoramento de mudanças em ecossistemas por meio da coleta de variações sonoras que refletem alterações na fauna, flora e até nas interações humanas.
Nesse horizonte, as mediações envolvem estudantes e docentes pesquisadores em experiências sensoriais enriquecedoras, que pode despertar a consciência sobre a preservação e importância dos sons em nossas vidas e nos ecossistemas. Ademais projetos dessa natureza transitam por questões ambientais e sensibilidade artística, ofertando experiências educativas rizomáticas.
O Padlet é uma plataforma digital de produção e publicação de conteúdo. Sua interface intuitiva facilita o trabalho colaborativo entre os estudantes, que podem registrar seus locais, descrever suas características e relacioná-los em lugares específicos, criando uma representação sonora de um território. Essa plataforma possibilita a confecção de mapas georreferenciados, nos quais é possível marcar pontos específicos e associar arquivos de áudio aos espaços, o que enriquece a atividade e amplia a compreensão das diversas paisagens sonoras de um ambiente.
Com suas especificações, o Padlet se torna uma intensidade em movimento poderosa para projetos educacionais ligados à cartografia sonora e outras abordagens. Dentre suas principais características, destacamos a facilidade de uso e flexibilidade. Ele pode ser utilizado individualmente ou em grupo facilitando a colaboração em tempo real, onde, professores, estudantes, equipes de trabalho e até mesmo grupos sociais podem criar e compartilhar ideias, organizar informações, planejar projetos e realizar diversas atividades colaborativas.
O Padlet oferece diversas opções de layout, como murais, colunas organizadas, mapas e cronogramas, permitindo que os usuários escolham o formato que melhor se adequa às suas necessidades. É usado amplamente em ambientes educacionais, pois estimula a interação e a cocriação, tornando o aprendizado mais dinâmico.
Desse modo, sugerimos usar o layout de “mapa” no Padlet, tutorial no link abaixo, para a mediação junto aos estudantes.
Os áudios podem ser gravados, captados, com aplicativos disponíveis em celulares, como o WhatsApp, utilizando o Audacity ou outro dispositivo. Após a gravação, os áudios podem ser salvos em uma pasta no celular ou computador. Em seguida, feito o upload desses áudios para o Padlet, organizando-os conforme a localização geográfica (coordenadas) da área destacada no mapa.
As distintas produções podem serem postadas em rede e passíveis de análises, comentários e sugestões dos demais estudantes e, até mesmo, caso queira, do público externo.
A cartografia sonora consiste em mapear o ambiente através dos sons, capturando as paisagens acústicas de um lugar ou contexto. Ao aplicar às artes, os estudantes criam representações sonoras que dialogam com o que veem, ampliando a experiência estética. O som, nesse caso, atua como uma ferramenta para interpretar e enriquecer o entendimento das obras de Arte.
Por exemplo, na obra, A Feira, de Tarsila do Amaral, que retrata uma cena de mercado, que sons ela teria? Os alunos poderiam imaginar e gravar sons de vozes, risadas, o barulho de mercadorias sendo manipuladas e até o som de instrumentos musicais típicos de feiras populares brasileiras. Esses sons criariam um ambiente auditivo que complementasse as cores vivas e o dinamismo da pintura.
Nesse rumo, os estudantes são convidados a criar interpretações sonoras dessas obras, dando uma nova camada de significado e expandindo as possibilidades de leitura artística. A mediação didática rizomática, inspirada pelos filósofos Deleuze e Guattari, rompe com a linearidade do ensino tradicional, propondo um método que valoriza as múltiplas conexões e experiências. Nesse sentido, não há uma única interpretação correta da obra ou um caminho predefinido de aprendizagem. Em vez disso, a proposta rizomática funciona como um sistema aberto, onde os estudantes podem explorar livremente as interconexões.
É uma plataforma colaborativa que permite explorar paisagens sonoras de várias partes do mundo, focando em registros ambientais sem edição, ideal para usos educacionais e de pesquisa (Audiomapa).
Esta plataforma colaborativa permite compartilhar e explorar paisagens sonoras. Você pode criar e adicionar seus próprios registros sonoros de determinada localidade ao mapa, categorizando-os conforme o tipo de som (urbano, rural, natural, cultural, etc.). O Audiomapa é ideal para projetos de cartografia sonora, pois permite uploads de arquivos em formato MP3 com qualidade recomendada de estéreo e taxa de amostragem de 44.100Hz ou superior.
PlayerMap é um script para desenvolvimento de aplicativos de mapas sonoros publicado sob uma Licença Pública Geral. Ressaltamos que o PlayerMap precisa ser carregado no seu servidor, assim, após adicionar algumas gravações ao seu grupo no soundclouad, baixe os arquivos de script do Github, e carregue-os para o seu servidor, como relatado no tutorial (link).
Os áudios originais são capturados nos ambientes a serem mapeados e feito upload na plataforma Soundcloud (criar conta), assim que carregar suas gravações e adicioná-las ao seu grupo do SoundCloud introduza a localização (Ex. “Lat:40,416775”, “Lng:-3,703790”) de cada uma das faixas que publicar. Para isso, você deve usar tags, no formulário de upload você encontrará um campo para adicioná-las, copie e cole as informações geográficas seguindo este exemplo e lembre-se de escrever ambas as tags entre aspas, use sempre o ponto para separar decimais e escrever com precisão.
Referência
PEASE Celma et al. Cartografia sonora da avenida Ganzo. n. 11, v.3, 2019. PIXO – Revista de Arquitetura, cidade e contemporaneidade. Disponível em: https://periodicos.ufpel.edu.br/ojs2/index.php/pixo/article/viewFile/18059/11163. Acesso em: 29 jan. 2022.
Paisagens Sonoras sobre obras de TARSILA DO AMARAL – uma viagem sonora
Exposição “Cartografias Sonoras” explora sonoridade de objetos do cotidiano
Paisagem Sonora, Memória e Bem-estar no Butantã
Cartografia dos sons: a paisagem sonora da UFJF por um viés sensível-cultural
As Dobras do Espaço: uma cartografia sonora da cidade de Dourados
PAISAGEM SONORA – VAMOS ENTENDER MELHOR